01 dezembro 2006

as cidades têm luzes nas palavras

uma flor colhida por eduardo prado coelho,
no suplemento 'mil folhas', jornal 'público', hoje, 1 de dezembro:

ela disse: sou uma cidade esquecida.
ele disse: sou um rio.

ficaram em silêncio à janela
cada um à sua janela
olhando a sua cidade, o seu rio.

ela disse: não sou exactamente uma cidade,
uma cidade é diferente de uma cidade esquecida.

ele disse: sou um rio exacto.

agora na varanda
cada um à sua varanda
pedindo: um pouco de ar entre nós.

ela disse: escrevo palavras nos muros que pensam em ti.
ele disse: eu corro.

de telefone preso entre o rosto e o ombro
para quão menos se libertassem as mãos
cada um com suas mãos libertas
ele temeu o adeus
disse: sou uma cidade esquecida.
ele riu.

filipa leal, in 'a cidade líquida e outras texturas', editora 'deriva', 2006