29 abril 2008

a rapariga de azul
tinha dois arco-irís no lugar dos pés.

na igreja,
rezavámos por nossos avós,
e por nossos outros corações
espalhados pelo mundo-em-nós.
tínhamos a nítida sensação
de sermos os únicos a reparar.

esperar milagres, isso sim!
olhar ao alto, como não?
agora olhar para uns pés humildes..
ainda acabava em processo de destituição
da nossa querida linhagem auto-atribuída,
final terrível para tão ínclita geração.

e assim milagre maiúsculo? zero
de diálogo divino nem resquício.
perceberam bem
ou voltamos ao início?

a rapariga de azul era pobre e triste
os pobres topam-se a milhas, dizeis bem,
mas não se esqueçam vós que orais
a condição de quem nasceu nessoutra belém.

os milagres estão ao pé dos mais simples.
uns pés de uma rapariga de província,
os pés de uma rapariga de azul,
(o vosso coro:
uns pobres pés, pode lá isto ser?)
eram pobres os pés e pobre a rapariga,
mas os arco-irís que neles nasciam,
milagre acontecido e a acontecer,
não os trocava por nenhum de vós
e olhem que juro pelo mais sagrado
que naquela igreja, naquele fim de tarde,
eram só três dos meus amados avós.

nunca vão entender estes poemas,
pensarão: pobre pateta este joão.
em verdade vos digo:
antes pateta e com dois arco-irís nos olhos
que ser como tu, meu triste e baço e piedoso concidadão.

(e ao chamarem-me pobre
fazem de mim mais nobre
sem precisar de azular,
mas azul fraco,
o que nasceu vermelho,
mas vermelho forte.
esqueçam-se de vós,
olhem: culpem a sorte..)

1 Comments:

Blogger Abssinto said...

Nada pateta, nada pateta. Talentoso.

quinta-feira, maio 01, 2008 4:58:00 da tarde  

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