10 maio 2010

porque não sou do benfica.

nunca poderia ser de um clube que arroga a dimensão como argumento. o estafado argumento dos 6 milhões, tal como celebrizado por um castiço ex-presidente, contém uma insuportável dose de proto-fascismo social. eu nunca pertenci a nenhuma maioria, a não ser eventualmente a decorrente do voto. mas esta decorre de uma escolha individual e reversível (de 4 em 4 anos). não se confunde com fantasias semi-metafísicas sobre "o povo escolhido". um populismo de massas travestido de grandiosidade serôdia leva sempre ao mesmo desfecho: a irrelevância histórica. deixem o tempo falar.

nunca poderia ser de um clube que é uma espécie de montra do que o portuguesismo tem de pior. um benfiquista, em regra (que, como em tudo, há excepções virtuosas), vive obcecado entre um passado mitificado (o benfica europeu, o eusébio, etc.), um presente enviezado (nos últimos 4 anos, ficaram sempre atrás de sporting e porto, mas não se lembram disso..) e um futuro simplesmente irreal ("o sporting vai desaparecer, o benfica vai esmagar" - gritava ontem uma alma; "quero ser campeão europeu", dizia Jesus, esquecendo a dimensão interna da equipa e do nosso futebolzinho.)

nunca poderia ser de um clube que vive entre febras e copos de três, mistura de popularucho e popular, sem elites, quase sem aristocracia, quase sem burguesia, quase sem intelectuais. como engenharia social, estamos conversados sobre a riqueza desta espécie de estado dentro do estado. dir-me-ão: mas se são tantos, todas essas tipologias têm de lá estar. verdade e mentira. verdade, porque estão, em regime de quotas. mentira, porque convém não esquecer que estamos em portugal, logo a base de recrutamento dos aficionados benfiquistas tem exacta correspondência na amorfa estrutura social do bom povo português.

nunca poderia ser de um clube insuportável, que ganhe (menos vezes) ou perca  (mais vezes), é sempre o maior, assente no prestígio europeu (uma falácia), no palmarés esmagador (uma complexa construção do regime, por muito que digam o contrário), numa mística de feira popular.

se o V império tem tons vermelhos ou encarnados, então eu saio já na próxima paragem. ninguém aguenta viver num portugalzinho exponenciado ao quadrado - se ser português é ser benfiquista, eu sou cidadão do mundo; se ser benfiquista é ser português, estamos conversados. nunca mais fazemos deste país uma coisa outra.

dito isto, convém fazer uma declaração de interesses: acho que a estratégia de gestão do clube é bem pensada e melhor executada, mesmo sem ter acesso aos (sempre importantes) pormenores dos bastidores. a maior parte dos meus amigos são benfiquistas. sempre "simpatizei" com raparigas benfiquistas. desculpem-me umas e outros, mas os sportinguistas são assim - igualmente insuportáveis. e, nestes tempos, cada vez mais mal-humorados ;-).

4 Comments:

Anonymous Anónimo said...

nunca tinha entrada neste blogue, embora já tivesse ouvido falar nele.como sempre, para variar, o seu texto é um portento. mas vou-lhe dizer a razão pela qual sou benfiquista (eu que nem percebo bem as regras do futebol e gosto mesmo é dos mundiais): porque fui amiga dum ex-presidente do benfica, dum aristocrata de lei e de sangue (não dos falsos). é esta a razão de ser, absurda seguramente, pela qual sou benfiquista. se eu fosse dona duma editora ou editora dum jornal, convidava-o para trabalhar em full-time! pcp

segunda-feira, maio 10, 2010 3:26:00 da tarde  
Blogger Nuno Guronsan said...

Haja humor, amigo Gi.

Eu que sou benfiquista (quase sem escolha), que sou português (definitivamente sem escolha), que não sou aristocrático (sem perceber muito bem o que é isso), muito menos intelectual (lá está).

Este ano ganhou o Benfica, para o ano ganhará outro. Não passa de um jogo. E sim, dentro de tudo isso que mencionas, continuo a ser benfiquista.

Forte abraço.

segunda-feira, maio 10, 2010 7:30:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

minha cara e meu caro,

é deveras engraçado: publicamos um textinho provocatório, algures entre a 'blague' e o panfletário, e saltam logo os leitores amigos da toca ;-).

sim, sou sportinguista. e isso nota-se, diria um sociólogo. mas o texto tem partes sérias e partes francamente caricaturais.

acima de tudo, detesto fundamentalismos imberbes, quase tanto como detesto relativismos atávicos.

não pretendi ofender o benfiquismo de ninguém, muito menos outras características sócio-biográficas.

fica esta nota, não vão pensar que, como agora se diz, "me passei".

honra aos vencedores e dignidade aos vencidos (uns e outros, do dia de hoje, não mais do que isso, convém lembrar..).

foi ou não foi bonito, numa cidade que tem uns quantos milhares de sportinguistas fanáticos, ver uns largos milhares de benfiquistas fazer a festa, sem quaisquer problemas? foi, sim senhor.

dito isto, só tenho mais uma coisa para contar:

spoooooooorrrrrtiiiiiiiiiiiigggg!!

tenho dito.

;-).

flores bem-humoradas,


gi.

terça-feira, maio 11, 2010 10:02:00 da manhã  
Blogger Nuno Guronsan said...

A toca tem-me ocupado mais tempo do que queria, realmente, mas nunca perco as tuas palavras. Sempre com aquela sensação de que não tenho muito a comentar, pois elogios em demasia andam acabar por dar em textos panfletários...

:))

Tens muita razão, os adeptos do Sporting deram uma bela lição de civismo aos adeptos do FCP e do SCBraga. Apenas espero que, se para o ano houver uma mudança de lado na Segunda Circular, os adeptos do meu clube se portem da mesma maneira.

Qualquer dia ainda combinamos e vamos juntos ao futebol, tu de verde-e-branco e eu de vermelho.

Abraço, meu caro.

terça-feira, maio 11, 2010 11:23:00 da manhã  

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