22 março 2011


pois é, a gente já sabe, este é mais um dos tipos esquisitos que este blogue desencanta, com esmero e afinco, volta e meia. para mais, um rapazola prolixo, que mete cá fora disco após disco, nenhum deles exactamente falhado, mas nenhum deles imaculado. rewind. há meia-dúzia de anos, ryan adams - é dele que falamos - lançou-se nesta coisa da música em nome próprio (antes, havia tido bandas e outros projectos mais ou menos anódinos ou mais ou menos anónimos) com um disco chamado "heartbreaker" (e que, convenhamos, é todo um programa). deste disco, sabem os que me são mais próximos, bem posso dizer que é um dos discos da minha vida. um dos 100. um dos 50. talvez mesmo um dos 20. para quem gosta tanto, mas tanto, de música e de canções e de coisas assim, dizer isto é dizer qualquer coisa de substantivo, acreditem. diziamos que o rapaz lançou-se nestas lides com esse disco, "heartbreaker", um disco de 15 canções, cujo alinhamento sequencial, talvez entre a faixa 1 e a faixa 10 ou 11, é pura e simplesmente avassalador. nunca mais gravou nada assim, apesar de ter gravado discos razoáveis e canções boas, sem qualquer favor. dizem-me agora que se vai estrear em portugal, daqui a dois ou três meses. num daqueles projectos sonhados, que todos temos, este seria um dos nomes que eu traria a portugal - uma espécie de "winter session's", dedicadas a concertos a meio caminho entre o intimista e o emocional e melodicamente arrasador, naquele registo especial que faz de certas coisas, isso mesmo, inesquecíveis. ryan adams, como toda a gente, pode dar maus concertos. mas, suspeitamos, ryan adams pode dar concertos que perduram em nós, anos a fio. talvez em junho, creio que é o mês, já em pleno verão, o inverno e as flores desçam até à aula magna. ou subam, que isto de posições relativas nunca é ciência exactamente exacta.. ryan adams perdeu-se em vícios e dependências, pelo caminho, como tanta gente que estimamos (e como alguns que conhecemos). nós, que da vida sabemos umas poucas coisas, sentimo-nos sempre próximos destes tipos, seguindo aquela linha de afectos lançada por jack kerouak (e se não foi ele, as nossas humildes desculpas) que dizia que só se interessava e só lhe interessavam as pessoas que nunca se aborreciam, aquelas que ardiam como fósforos. é também por isto que ryan adams é cá dos nossos. porque podia ter sido tudo, ou mais, ou diferente, porque pode ainda ser tanta coisa diversa.. mas não, calhou ter sido assim. e é exactamente assim que gostamos dele. com palavras tristes, com uma poesia profundamente melancólica, com uma harmónica que geme e chora e nos toca, com uma viola que nos embala e dá o açúcar de que precisamos para seguirmos esta eterna viagem.
bem-vindo, amigo. e obrigado pelas centenas de vezes que escutei "heartbreaker", na íntegra ou quase, sózinho - mas não só - e senti que sabias exactamente, dor a dor, tudo o que de escuro me ia no coração. e isto, na vida como no resto, não tem preço. mas tem valor.